sexta-feira

redundâncias

exercício prático do polegar direito

aquela laranja
lembra o solo da alma
cinza

formulação teórica de qualquer dedo

plana
é a alma
que se deixa planar

quinta-feira

preferi a fuga à saudade
neste ponto irredutível
discordo de todos quanto discorrem sobre o tempo
pois aos ventos que parto jamais lhes direi
não sou capaz
não sou capaz de errar a teu lado
faço-me um favor
tropeço no olhar
atiro contra a dor
que nos há-de abraçar.

quarta-feira

(in)certeza

sabe ou não quer sentir o coração quando chove?
haverá forma de responder sem tornar a inquirir?
esqueça
hoje, o sol funde-nos as artérias
vazemos mesmo aqui
a retórica.

segunda-feira

A bíblia

Se calhar
a minha cabeça é um vaso
se calhar coberto de pétalas

Se calhar
quebrarei ao teu sorriso
se calhar amarelo como nunca

Se calhar
procurarás um beijo
se calhar mais e mais

Quero que saibas:
a vesícula não deu sinal
o horóscopo bate certo
a gata tem comida até amanhã
o aquecedor funciona

Se calhar
foderemos
senão cada um masturbar-se-á com o livro que melhor nos define.

quinta-feira

repetirei, se for preciso

não há palavras
que nos comovam
tanto como o passado
rebobino-me
primeiro dente?
já nem tenho
primeiro choro?
já nem oiço
primeiro beijo?
já nem sinto
basta
pronuncio a derradeira certeza:
o tempo é uma espinha no rosto.